18 de mai. de 2011


Custo Zero !



Alguém tem idéia do custo de um barril de petróleo? Uma chapa de mármore de Carrara? Uma tonelada de trigo, ou soja, ou milho? Uma dúzia de sardinhas, ou uma lagosta, ou um pargo? Um diamante?
Zero. Zero!
A única coisa que há a fazer é ir “lá”, trazer o petróleo para cima, cortar a chapa na pedreira, colher o trigo, ou a soja, pescar o peixe, procurar e encontrar o diamante, etc. Tudo existe à nossa disposição! Conclui-se, facilmente, que tudo quanto se encontra na natureza tem custo ZERO. O mal é começar-se a quantificar essas dádivas, não pelo custo REAL da sua produção, mas, sobretudo, acrescentando-lhe o infame fator de especulação, que se pode basear, por exemplo, em raridade, mas que é SEMPRE produto da ganância, da estratégia geopolítica (outra forma sofisticada de ganância), etc.
A continuar assim, esta ganância vai, não muito a longo termo, acabar com a espécie humana! Para a Terra não há qualquer problema, porque a natureza, poderosa, se regenera sozinha, e voltará a ser a maravilha que nós, com dificuldade, conseguimos imaginar o que seria no tempo do vovô Adão!
O homem já é descartável, e talvez aconselhável. É bem possível que esta aventura da humanidade na Terra tenha sido só uma experiência de Deus; mais tarde Ele voltará a soprar noutra figura de barro, já sem os defeitos dos atuais vorazes.
Porquê os flamengos se querem separar dos valons, na Bélgica? E a Catalunha, ou o País Basco, da Espanha? E o Sudão do Sul do Norte? E a Groenlândia da Dinamarca?
Tudo por causa da grana! Ninguém quer estar a pagar impostos para proteger uma área mais pobre do território! Ou pior, cada um quer ver se se apropria, ao máximo, dos recursos do “seu” (deles?) país.
A Groelândia, enquanto foi somente reduto de esquimós, focas e ursos, ninguém lhe dava importância. Agora que se sabe que é rica em montes de recursos minerais, os daneses... que se danem!

 
Há pouco tempo escrevi à senhora dona presidentA perguntando-lhe porque alguns medicamentos, genéricos, chegam a custar, no Brasil, 5,4 vezes mais do que, por exemplo, em Portugal.
Sexa mandou para o ministério da saúde, este entregou à “ANVISA” – Agencia Nacional de Vigilância Sanitária – que me mandou ver no seu site da Internet a resposta ao problema que eu expus. Eis a conclusão (brilhante!):

“Parecer Final: Prezados,

Diante dos abusos de poder de mercado das indústrias farmacêuticas, bem documentadas pela CPI de medicamentos do final da década de 1990, foi sugerida naquela época o controle de preços de medicamentos em um novo formato. Não como o anterior, que se baseava em planilha de custos, o que permitia o aumento de preços devido ao uso de uma substância mais cara, por exemplo. Após a extinção do órgão que controlava preços, que ocorreu no início da década de 1990, foi observado um alto índice de reajuste de preços, sem controle nenhum do Estado. Após as denúncias de falsificação de medicamentos e dos abusos de indústrias farmacêuticas sobre os preços, foi instaurada a CPI de medicamentos. Essa concluiu seu relatório com uma série de recomendações, dentre elas o estabelecimento de um marco regulatório que contornasse tal situação,e a criação da Câmara de Medicamentos - CAMED - (atual Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos, CMED).
Criada em dezembro de 2000, a CAMED, posteriormente substituída pela CMED, estabeleceu uma série de regras para ajuste de preços e reajustes anuais. Considerando a tarefa de estabelecer regras de regulação do mercado, foram feitos levantamentos e estudos a fim de definir o modelo mais adequado à realidade brasileira. Fato é que desde janeiro de 2001 as regras de regulação do mercado foram aprimoradas, dentre elas, a de ajustes de preços de entrada no mercado.
Entretanto, o mercado farmacêutico é muito mais dinâmico que o processo de alteração da legislação, o que influencia o preço do medicamento e as possíveis disparidades entre os países. Em outras, palavras, o medicamento Zocor, referência do medicamento Sinvastatina já era comercializado antes da regulação de preços e apenas informou o valor praticado à época. A partir de 2001, o reajuste de preços do Zocor seguiu os critérios da CMED a partir do valor informado.
O preço do medicamento genérico sinvastatina foi calculado a partir do preço do medicamento de referência (Zocor) e atendeu os critérios estabelecidos pela Lei de que o máximo valor que pode praticar é de 65% do valor do medicamento de referência.

Atenciosamente

NÚCLEO DE ASSESSORAMENTO ECONÔMICO EM REGULAÇÃO

MR”
 
Moral da história: em primeiro lugar fiquei muito emocionado quando me tratam de “prezados”! Adorei, só que devia estar no singular. Mas a conclusão é demasiado óbvia: é assim, porque... é assim mesmo, e não venha novamente com reclamações!
Isto tudo encanta, e mesmo que se vá reclamar ao Cristo lá no Corcovado, Ele levanta os braços, abre as mãos, ar sereno, mas magoado, como a dizer-nos: “Tenho muita pena mas o assunto não é comigo!” E de fato, não é!
Mas o jornal de hoje trás uma fantástica informação sobre uma pesquisa feita pelo Procon – Proteção ao Consumidor – exatamente sobre os preços dos medicamentos genéricos, onde encontrou variações de até 986% ! Novecentos e oitenta e seis por cento! Não acreditam?
Aqui vai a notícia:



Pois! Como dizia a Josefina que gostava muito de dizer coisas! (Saudade do grande Raul Solnado).

17 de maio de 2011

2 de fev. de 2011

CATURRICES

LIGADOS À MÁQUINA - III

 Antes de prosseguir, um reparo técnico, para alívio da minha consciência: ainda que seja uma prática muito vulgarizada, faz pouco sentido medir a Dívida Externa (seja ela pública ou privada) em termos de PIB. Uma é a “fotografia” numa determinada data (uma visão estática, um stock); o outro é um acumulado ao longo de um ano (uma visão dinâmica, um fluxo).


 O que faria sentido, e seria da maior utilidade, era, sim, comparar o serviço da Dívida Externa (reembolsos, juros e encargos; fluxos, portanto) com o PIB e as projecções do PIB (outros fluxos). Infelizmente, não estão disponíveis dados sobre o serviço da Dívida Externa, nem no ano corrente, nem nos anos vindouros. Será porque ninguém sente a falta dessa informação? Ou é “top secret”, para não cair em mãos de hereges?


 Mas se não sentem, deveriam. É que, para ver a Dívida Pública ao exterior, e só esta, reduzida a metade ao fim de 10 anos, seria necessário que, superavits da BTC e Investimento Directo Estrangeiro, entre eles, gerassem, por ano, acréscimos de Reservas Cambiais (antes do serviço da Dívida Externa) da ordem dos 5%-6% do PIB [Nota: Nada de críticas, Leitor; trata-se de uma relação entre dois fluxos]. O que sugere para onde olhar e dá uma primeira ideia sobre a dimensão do problema que verdadeiramente nos atormenta.


 Continuemos então com o PIB como medida, à falta de melhor. A questão que ficou em aberto é a de saber como foi possível financiar deficits anuais da BTC tão elevados (desde 1997/1998, sempre acima dos 8% do PIB e várias vezes a ultrapassarem os 10%). Porque, não tenhamos ilusões, se esses deficits não fossem financiáveis, nunca teria sido possível um desequilíbrio externo de tamanha amplitude, durante tanto tempo.


 Os acréscimos líquidos da Dívida Pública ao exterior dariam para financiar o equivalente a 2%-3% do PIB, se tanto. Mas, e o restante? Como foi financiado o restante, estes anos todos?


 Através das Famílias não terá sido certamente, porque as Famílias residentes, como se sabe, não têm acesso directo aos mercados financeiros internacionais. E as Empresas, por cá - excepção feita a umas quantas, poucas (tratarei destas numa próxima Caturrice) - também não encontram lá fora Banco ou Instituição Financeira que lhes empreste.


 Sobram os nossos Bancos. Mas convém começar por esclarecer que o BdP, após a adesão à zona Euro, deixou de emitir dívida nos mercados financeiros internacionais. Ergo: os Bancos que têm estado a sustentar o desequilíbrio externo são, unicamente, os Bancos Comerciais (que designarei simplesmente por Bancos, daqui em diante).


 E ocorre perguntar: (1) Como é que eles, por sua vez, se financiaram, donde lhes veio o dinheiro? (2) Poderão continuar a financiar-se como até aqui? (3) Haverá limites para o endividamento externo dos Bancos? (4) Que efeitos teve o endividamento externo dos Bancos na economia portuguesa?


 Basearei as respostas no conjunto dos 7 maiores Grupos Bancários portugueses (BCP, BES, BPI, BST, CGD, BANIF, MG/CE), os quais representam mais de 85% do Activo Líquido (imobilizado, carteiras de crédito bancário e de títulos, etc., após amortizações e provisões) do nosso sistema bancário. Designá-los-ei por “Bancos” ou “amostra”. E, para que o texto não fique tão denso, representarei mil Milhões por mM.


 Começando pelo princípio. Nos últimos 10 anos, os Bancos procederam a entradas de capital, mas não suficientes para exibirem, hoje, níveis de capitalização (com base nos Capitais Próprios - ou seja: Capital Social mais Prémios de Emissão mais Reservas mais Resultados Transitados, mas excluindo o Resultado do Exercício em causa) confortáveis.


 [Nota: Não estranhe, Leitor, esta minha preocupação com definir o que sejam Capitais Próprios. Por razões que, de todo, me escapam, os Reguladores, por esse mundo fora, têm permitido que a Banca, em geral, considere como Capitais Próprios rubricas que as restantes Empresas são obrigadas a contabilizar no Passivo Remunerado. Num sector gravemente descapitalizado, por obra e graça também destas fantasias contabilísticas, os Bancos portugueses não são excepção.]


 Retomando o fio à meada...E emitiram dívida a médio/longo prazo nos mercados financeiros internacionais, além de contarem com os Depósitos dos seus Clientes. Só que: (1) nem a “base de Depósitos” [Nota: A proporção dos Depósitos no Passivo Remunerado Total] aumentou visivelmente na generalidade dos Bancos; (2) nem eles se preocuparam muito com isso, privilegiando, sim, a tomada de fundos por grosso, no mercado monetário interbancário internacional (MMIX; na realidade, junto de uma dúzia de Bancos, não mais).


 E chegamos, finalmente, ao fulcro da questão. Em 31/12/2009, os 7 maiores Grupos Bancários estavam endividados no MMIX em € 43.9 mM (26% do PIB - dos quais € 14.9 mM (9% do PIB) a Bancos Centrais (e não só ao Eurosistema).


 Esta dívida bruta, e só esta, representava, no fecho de 2009, 1.9x os Capitais Próprios na amostra (variando entre 1.1x e 4.7x), com um prazo médio ligeiramente inferior a 6 meses (variando entre os 3 meses e os 15 meses).


 A dívida líquida (isto é, dívida bruta, deduzidas as posições credoras no MMIX e as aplicações junto de Bancos Centrais) era de € 31.4 mM (19% do PIB; 1.4x os Capitais Próprios na amostra, variando entre 0.4x e 3.5x).


 Igualmente interessante é notar que, com vencimento a menos de 1 ano, junto do MMIX, as dívidas excediam as aplicações em € 14.7 mM (9% do PIB; 0.63x os Capitais Próprios, na amostra; € 1.9 mM a menos de 3 meses, mas com um Banco a atingir, neste prazo, um descoberto de € 5.5 mM) o que dá bem a medida do que seja a “ansiedade do roll over”: Será que os Bancos depositantes vão renovar os seus depósitos no vencimento? Será que conseguiremos reaver todas as nossas aplicações no MMIX?


 Decorridos 6 meses, em 31/06/2010, a situação tinha mais ou menos este aspecto:


- Endividamento bruto junto do MMIX: € 68.1 mM (40% do PIB; 3.0x os Capitais Próprios na amostra, variando entre 1.6x e 6.4x), dos quais € 40.9 mM (24% do PIB) junto de Bancos Centrais;


- Prazo médio da dívida bruta junto do MMIX: nos 3 Bancos que publicaram a distribuição temporal do seu endividamento junto do MMIX, o prazo médio encolheu entre 1 e 5 meses (é incompreensível como os Bancos são autorizados a omitir, nas suas Demonstrações Financeiras semestrais, informação de tal importância);


- Dívida líquida (conforme ficou definido mais acima): € 56.9 mM (33% do PIB; 2.5x os Capitais Próprios na mostra, variando entre 1.5x e 5.8x);


- Roll over a 1 ano (estimativa, uma vez que 4 dos Bancos não divulgaram dados): cerca de € 40.0 mM (23% do PIB; 1.8x os Capitais Próprios na amostra);


- Roll over a 3 meses (idem): cerca de € 30.0 mM (18% do PIB; 1.3x os Capitais Próprios na amostra)


 Pergunto se, em vista disto, ainda fará sentido arrepelar os cabelos por causa do estado da Dívida Pública e do deficit orçamental.


 É que alguns Bancos ultrapassaram já (e não foi hoje nem ontem) o limiar de endividamento no MMIX que desencadeou a crise asiática de 1997 – e o nosso sistema bancário, como um todo, há uma década que ronda perigosamente esse limiar. (cont.)


A.PALHINHA MACHADO


Setembro de 201

31 de jan. de 2011

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"CATURRICES"

LIGADOS À MÁQUINA - II


 Os deficits do OGE! A Dívida Pública! É isso! É isso!

 Não, Prezado Leitor. Não é isso. O descontrolo orçamental tem, entre nós, todos os traços de uma doença crónica, que nos debilita, mas não leva ao coma. Leva, sim, à inflação, umas vezes rastejante, outras, galopante – em que a nossa história pátria é tão fértil.

 Convivemos com tudo isto há décadas (séculos?). Reflexo perfeito do modo como entendemos as actividades financeiras: extorquir aqui o que for possível, de mansinho, para dar ali e partilhar acolá, com grande e ostensiva liberalidade.

 Novidade, novidade, é, sim, o facto de integrarmos uma união monetária (uma espécie de regime padrão-ouro dos velhos tempos), pelo que a inflação endógena (que vai erodindo o peso real do endividamento) e a desvalorização cambial (que reequilibra a BTC) deixaram de ser opções de política económica ao nosso alcance.

 E também é novidade (algo que já não se via desde finais do séc. XIX) o modo como a Dívida Pública tem sido financiada nos últimos anos (leia-se “desde 1997/1998”): preferencialmente, no exterior. Quando, por estranho que pareça, os gastos públicos (excepção feita a um ou outro investimento público, a alguns consumíveis hospitalares e a pouco mais) são, apenas, remunerações, fornecimentos e serviços contratados localmente.

 Ao ser recebido, o financiamento externo da Dívida Pública que exceda o efeito directo dos gastos públicos sobre a BTC vai aumentar a capacidade de pagar ao exterior. E tal foi visto, e propagandeado, como virtude por quem fazia de conta que esses empréstimos só teriam de ser reembolsados lá para as calendas gregas (que premonição!) - e que os respectivos juros (mais comissões, encargos e outras frioleiras) eram migalhas sem importância.

 Se essa acrescida capacidade de pagar ao exterior tivesse ficado retida no Banco de Portugal (BdP) sob a forma de Reservas Cambiais, daí nenhum mal viria: na devida altura haveria por cá (não necessariamente no Tesouro, mas no BdP) com que pagar esses empréstimos. E o pinga-pinga dos juros não faria mossa por aí além no deficit orçamental - sempre que a Dívida Pública ao exterior se mantivesse bem abaixo dos 30% do PIB.

 Mas não. Era rapidamente convertida em Reservas Excedentárias dos Bancos e estes, por sua vez, convertiam-nas, ainda mais rapidamente, em empréstimos que financiavam os devaneios dos residentes – os tais devaneios que só se tornam realidade lá fora e são pagos em moeda forte (leia-se: sacando sobre as Reservas Cambiais).

 Ou seja, essa capacidade adicional de pagar ao exterior entrava por via da Dívida Pública, e era logo utilizada em devaneios que o crédito bancário permitia concretizar. Evaporava-se assim num ápice, sem deixar rasto nos haveres do Tesouro, do BdP ou dos Bancos. Rasto, só na BTC - mas aí como deficit.

 Como era fácil de prever, as dificuldades surgiriam quando a Dívida Pública ao exterior se vencesse e tivesse de ser paga – mas paga mesmo, e não refinanciada para um futuro ainda mais longínquo por um qualquer dos comparsas (Tesouro, BdP, Bancos).

 Sabendo-se, de ciência certa, que a receita fiscal, só por ela, é incapaz de aumentar as Reservas Cambiais, o efectivo pagamento da Dívida Pública ao exterior só estaria assegurado de antemão se, entretanto, a BTC registasse superavits de igual amplitude (os fluxos de Investimento Directo Estrangeiro e outras entradas de capitais são demasiado aleatórias para influenciar os cálculos).

 Fatalmente, aquele “quando” transformou-se em “agora” logo que o endividamento externo (e não só da Dívida Pública ao exterior) atingiu níveis que os investidores estrangeiros, por norma, não vêem com bons olhos.

 Aliás, a avaliar pelas estatísticas que vêm a público, parece que nem o BdP, nem o IGCP (a entidade que gere a Dívida Pública) fazem a menor ideia de quanto seja a parcela da Dívida Soberana na posse de não residentes (DSX). É estranho que, em face do coma e do prognóstico, estas duas respeitadas instituições não tenham sentido ainda a necessidade de acompanhar de perto os sinais vitais do paciente.

 Ponto da situação:

- No fecho de 2010, com a Dívida Pública a ultrapassar os 90% do PIB, a DSX deverá rondar 50% do PIB, para mais [m/ estimativa a partir da Dívida Pública que se encontrava na posse de Instituições Financeiras (Bancos, Seguradoras, Fundos de Investimento e Fundos de Pensões) residentes, no final de 2009];

- Os juros a pagar ao exterior, ao custo a que a DSX está a ser refinanciada, absorverão anualmente mais de 3% do PIB - e isso faz mossa no exercício orçamental;

- Não é seguro que os mercados internacionais continuem a refinanciar a DSX, mesmo se o Governo português se dispuser a pagar juros muito mais elevados;

- No cenário optimista, a DSX subirá para cerca de 90% do PIB (por força das necessidades de financiamento adicionais do Estado) - e, assim sendo, só para juros irão mais de 5% do PIB;

- Ainda no cenário optimista, ou se atinge, a curtíssimo prazo (até 2012, o mais tardar), um saldo orçamental primário (isto é, antes do pagamento dos juros da Dívida Pública) não inferior a 5% do PIB, ou a situação ficará irremediavelmente fora de controlo, por ser de todo impossível continuar a refinanciar também os juros que há que pagar ao exterior;

- No cenário pessimista, a DSX terá de ser colocada prontamente junto do FMI, ficando o Estado sem acesso aos mercados financeiros internacionais por vários anos (felizmente para nós, os investidores propendem a ter memória curta e não são de guardar rancores).

 Tudo isto seria suficiente para nos deixar em maus lençóis, é certo. E tudo isto traz à memória os últimos anos da Monarquia Constitucional, com os seus políticos demagogos, os seus governos sem norte e a sua incompetência financeira gritante.

 Mas os deficits orçamentais teriam de ser substancialmente mais elevados durante os últimos 15 anos para que a Dívida Pública (mais exactamente, a DSX), só por ela, fosse a causa única dos deficits desmesurados que a BTC tem vindo a registar.

 Se o que nos pôs em coma foram os deficits, muito elevados e persistentes, da BTC, a causa maior terá sido, então, outra. (cont.)

A.PALHINHA MACHADO

Setembro de 2010

27 de jan. de 2011

Começamos hoje a série de

"CATURRICES"
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de A. Palhinha Machado

LIGADOS À MÁQUINA - I


 Sente-se bem, Caro Leitor? Cheio de genica, de projectos, de entusiasmo, nesta rentrée? Confiante no amanhã? Com vontade de fazer coisas, de correr mundo, de partir à aventura?

 Pois desengane-se! Desde há meses a esta parte só vive porque a “máquina” o mantém vivo. Sem ela, já teríamos, os mais de nós, dado o triste pio – dalits de mão estendida à caridade do mundo.

 A “máquina” tem nome, para que possamos manifestar-lhe o nosso reverente agradecimento. Aliás, são duas máquinas:

- Uma, de terapia assim a modos que intermédia, vulgarmente conhecida por “Mercado Interbancário do Euro” (MIE) – e desde 1997/1998 que não sabemos passar sem ela;

- A outra, o “Banco Central Europeu” (BCE; ou “Eurosistema” para os mais íntimos), de terapia intensiva (do mais intensivo que há), vale-nos só a partir de 2008/2009 – mas, por vezes, não basta.

 O “sopro de vida” que delas recebemos tem nome também: liquidez (na maior parte, sob a forma de Euros; aqui e ali, porém, em moedas mais exóticas, como o Kwanza angolano).

 O coma está diagnosticado: excessivo endividamento junto de uns, poucos, credores estrangeiros (para todos os demais, há anos que somos dalits). Entenda-se: dívidas do Estado, dívida dos Bancos e dívida de uma meia dúzia de empresas - dado que o vulgar cidadão e os seus negócios nunca encontraram quem, de lá de fora, lhes emprestasse directamente um chavo.

 A maleita vem em qualquer compêndio: povo pobre com gostos ricos - mal aparece quem fie, o endividamento corre como fogo em mato seco.

 Infectados pelo vírus dos “direitos adquiridos”, padecendo cronicamente de “devaneios a realizar custe o que custar”, teimamos em viver muito acima das nossas modestas posses - numa vertigem tal que o coma do endividamento é cada vez mais profundo.

 Maleita antiga, pois desde meados dos anos ’90 que a Balança de Transacções Correntes (BTC) regista deficits enormes e sem paralelo na OCDE. Por palavras simples: muitos dos nossos devaneios só se tornam realidade lá fora - e têm de ser pagos em moeda forte. Quer o destino que o grosso dos nossos meios de subsistência (energia, alimentos) também.

 O prognóstico, esse, não poderia ser mais reservado: com a terapia intermédia praticamente esgotada, só nos resta a terapia intensiva. Apesar disso, a moléstia que nos deixou neste estado não dá sinais de ceder: continuamos a não perder nenhuma oportunidade para nos endividarmos sempre mais.

 Estamos, então, nos “Cuidados Intensivos”? Qual quê! Até agora, ninguém cuidou de nós. Nem nós próprios. Jazemos para aqui, imobilizados e vegetativos, à mercê da “máquina” – delirando com dinheiro a rodos, fingindo não ver que a rica vidinha destes últimos 15 anos terminou de forma abrupta e terrível.

 E se a “máquina” parar? E se os “donos da máquina” entenderem que é melhor desligá-la? Ficamos, os mais de nós, para aí, inertes e atarantados, sem saber que voltas dar à vida.

 Os poucos de entre nós que não precisam da “máquina” para nada, que vivem por eles próprios, que são competitivos nos mercados internacionais e financeiramente equilibrados, esses, continuarão rumo ao seu futuro, aos seus Cataios, às suas Índias, às suas Áfricas, aos seus Brasis – deixando-nos para trás como carga inútil, pesos mortos. Temem, apenas, que os arrastemos também para o coma profundo – e têm razão para temer.

 Como foi possível termos chegado a isto? Perguntam, agora, mesmo aqueles que para isto nos empurraram; aqueles que tinham a obrigação de nos alertar para isto; aqueles que eram pagos justamente para evitar que isto acontecesse. (cont.)

A.PALHINHA MACHADO

































26 de jan. de 2011

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Com a devida vénia, reproduzimos hoje um interessante artigo do jornal.

Legitimidades e vilezas

ROBERTO DaMATTA

Um traço visível, insofismável e indelével de nosso patriarcalismo escravista que curiosamente Gilberto Freyre não associava ao Estado, mas somente a sociedade, é — em toda tentativa de modernização — uma profunda crise de legitimidade. As regras não se encaixam aos comportamentos ou sequer com as suas implicações jurídicas. Essa incongruência surge em quase todos os domínios do chamado "estado", que confundimos (propositadamente ou não) com o seu lado mais personificado, o "governo" (que é sempre de alguém). O resultado e a vil transformação do legítimo em ilegítimo, tal como ocorre quando um tribunal condena um inocente. No momento chama atenção a questão da aposentada-ria de governadores, um sistema que permite acumular múltiplos benefícios de tal sorte que os "patrões do estado" (relativamente eventuais, mas com um olho grande nas vantagens permanentes) transformam a administração publica num mecanismo de enriquecimento pessoal a competir com o seu lado altruístico e "social". Neste processo, o Estado deixa de ser um sistema destinado a prestar serviços à sociedade. Só há grana para pessoal, não há como investir em educação, saúde, transporte e segurança.
Estou convencido que tal modelo nasceu na matriz aristocrática imperial somada ao neo-stalinismo, tão popular entre os "desenhistas" que sucessivamente reformaram (com um extraordinário pendor para o pior) a nossa administração publica. Tais engenheiros, chamados nos governos militares de "tecnocratas", sempre foram travestis dos velhos letrados ibéricos, bacharéis em Coimbra, e crentes num platonismo jônico que ate hoje proclama a letra da lei como tendo o poder (tal qual uma fórmula mágica) de modificar a realidade, resolvendo suas contradições. Esse fetichismo jurídico-político tem sido dominante na política brasileira. E dele que vem um brutal centralismo e o poder avassalador que faz com que um presidente tenha a capacidade de nomear milhares de pessoas e de distribuir para os ávidos comedores do bom presunto desse velho Reino de Jambon inúmeros cargos e instituições. Haja, porém, dinheiro para sustentar cada vez que tais mudanças sempre centralizadoras são feitas, causando roubos e rombos de todos os tipos. Numa fórmula, fizemos a república, mas jamais admitimos viver num sistema republicano. E os recursos da sociedade, furtados pelo Estado, são os construtores de uma curiosa dualidade: de um lado os milionários por ele vitaliciamente mantidos; do outro, os milhões de pobres e desvalidos que vibram quando recebem uma bolsa de pobreza! Tudo isso sob a égide de políticos bem vestidos e falantes, prontos para politizar tudo, até mesmo a política!

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Um amigo faz o desabafo: minha filha separou-se! O marido deu-lhe um cartão vermelho e fugiu de casa como um foragido da lei.
— Sei como é difícil... Mas com diálogo e bom senso tudo se resolve — repliquei, sabendo do poder desse tipo de tempestade.

— Pois, professor, bom senso e justamente o que não há. O fdp recusa conversar. Sabe como tocar no coração da minha filha, que se casou novinha e o tinha como modelo e mentor. Procrastinador, ele adia tudo e recusa ate mesmo os filhos que, moços, vão enxergando o pai como uma figura cada dia menor aos seus olhos. É de cortar o coração...

— Sabe qual é a ultima? Ele agora quer o seu nome de volta. Imagine, todos os documentos de minha filha tem o nome de casada e ele, sabendo como feri-la mortalmente, quer um pedaço daquilo que se incorporou a sua identidade. Na ultima conversa que tiveram, ela recusou e ele propôs, veja que vileza, vender o seu nome por algumas dezenas de milhares de reais. O senhor já viu isso alguma vez?

— Vi! — respondi com o coração partido pela contundência que a infâmia sempre produz.

E o Brasil moderno. Pelo partido come-se o Jambon, pelas ideologias fica-se rico, pelo nome de merda de uma família de bosta, um pobre diabo exige dinheiro da ex-companheira que o amou e que honrou esse mes¬mo nome que ele hoje desonra com todas as forcas do seu mau caráter.

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Que o leitor perdoe o mau humor do cronista que são não fala do flagelo dos deslizamentos e os comentários cretinos que provocam para não morrer do coração.

Mas onde a legitimidade transborda ilegitimidade, revelando o investi-lo do sistema, e quando ocorrem es¬ses acidentes que reiteram não o trágico e o aleatório dedo da natureza, que não escolhe lugar ou pessoa, mas o uso do trágico para encobrir o descaso dos gestores públicos, no Brasil chamados eufemisticamente de "políticos", uma palavra que, sabemos todos, inclui tudo menos responsabilidade pública. E por isso eu proponho não mais usá-la e bani-la do nosso vocabulário, substituindo-a por gestor, gerente ou administrador publico. Pois esses termos trazem a tona a dimensão de serviço e de desprendimento que os representantes desempenham nas democracias modernas como mediadores entre a sociedade e os seus grupos e o estado, por meio da governabilidade que exercem nos parlamentos e nas administrações coletivas.


ROBERTO DaMATTA é antropólogo. Texto retirado de “O Globo” de 26/jan/2011

23 de jan. de 2011

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No princípio era o caos...

E no fim ?



No princípio Deus criou a terra e os céus. Depois foi o caos, a confusão a bagunça. Houve que separar trevas da luz, terra da água e criar os animais.
E criou micróbios, amebas, insetos, insetívoros, herbívoros, carnívoros, e depois o homem matador e ganancívoro.
No relógio cósmico, o homem, que chegou por fim, ainda agora acabou de chegar. Em escala, desde o Big Bang, que terá acontecido há mais do que muitos anos, nós, os humanos, nem sequer sabemos ainda onde estamos, nem o porque de aqui estarmos.
Com todas estas crises, guerras, roubalheiras, desastres naturais, assassinatos entre príncipes e/ou magnatas e outros, destruição sistemática e consciente do meio ambiente, sobretudo das águas dos rios e fontes, há quem diga que isto é o fim do mundo, ou, de acordo com uma nova e muito interessante revista, Finis Mundi.
Se pensarmos que a terra “apareceu” há uns tantos bilhões de anos, e que o tal caos reinou por uns outros tantos, até aparecer a vida (vida sempre houve, que vida não se cria do nada!), o homem em vez de estar já no fim do mundo, ainda está no caos.
Ainda está a construir a Torre de Babel para se desentender!
Não há na história natural, indivíduos que da mesma espécie se matem entre si tanto como os homens têm feito. Pior, quando todos se consideravam cristãos, e cuja única palavra de “ordem” seria: AMOR.
Basta lembrar a Guerras das Rosas, o massacre de Saint Barthelemy, o Terror da Revolução Francesa, as guerras Napoleônicas, a, ainda hoje odiada, Inquisição, a guerra da Independência dos EUA, e tantas, infinitas, outras, como a Batalha de Aljubarrota.
Mataram-se por dogmas absurdos, como Trindade ou Dualidade, condenaram-se à morte cristãos porque “teimavam em benzer-se” com quatro dedos, depois com três, porque um “teólogo” dizia que tinha que ser só com dois, chegou a ser pecado grave persignar-se da esquerda para a direita, e quando os mercenários russos ouviram do bispo que Jesus dissera “Não haverá primeiro nem último”, cortaram o pescoço ao bispo, ajoelharam junto ao altar e esperaram que Espírito Santo baixasse sobre eles e o cadáver do bispo, e a seguir avançaram sobre o Kremlin para matar a família dos czares! Lutaram os cristãos, e lutam, entre si por privilégios financeiros, criaram as igrejas reformistas, dividiram-se em múltiplas, imensas “igrejas” (continuam as igrejas-comércio enganoso a prosperar como mosquito em águas paradas), e agora assistem, impunes, incapazes de suster o avanço do islão, unificado sob a palavra de Maomé!
Hoje, no mundo ocidental, chamado cristão, ou, no mínimo, herdeiro da civilização greco-romana, vemos a brutalidade da finança a esmagar, de qualquer jeito, os mais pobres, a frieza com que a indústria financeira experimenta ou coloca medicamentos no mercado com terríveis efeitos colaterais (todos os medicamentos os têm), a hipocrisia da venda de armas, aos parceiros ou até aos adversários, e ainda somos obrigados a assistir, neste mundo ocidental, a um violento declínio da ética, e a um caminho, sem retorno, para a extinção! Extinção esta que é consciente, mas irresponsável!

Toda a gente sabe que não se pode viver de empréstimos. E eles, os rapaces e incapazes governantes, também sabiam, e sabem, e assim mesmo, na sua visão destruidora, preferiram ajudar a abreviar a agonia dos seus povos.
A turba, que passa da adoração à raiva, e desta ao medo, não sabe ainda, fora raras exceções, conduzir o seu destino. Vota no demagogo, no fala barato, grita de entusiasmo pela vitória destes, e quando não se satisfazem com as esperanças vãs, apedrejam-nos. E não se satisfazem nunca, porque é cada um por si, e raros, raros, pelos outros.
E no fim? Vem à memória a única esperança que talvez nos reste, além da benevolência do Criador, na sua infinita bondade, em nos levar para lugar seguro: o Quinto Império, a salvação terrena!
Razão parecem ter Bandarra, Fernando Pessoa e Agostinho da Silva.
“Bem aventurados os humildes de espírito que deles será o Reino de Deus.”


Rio, 24/01/2011